Operação Farroupilha: Ildo Meneghetti, Passo Fundo e o golpe militar (1964)

Alex Antônio Vanin e Roberto Biluczyk
Mestrandos em História – PPGH/UPF

No início da década de 1960, o Brasil enfrentou uma grave crise política e institucional. Após uma conturbada posse, em setembro de 1961, que envolveu a desconfiança dos ministros militares e a implantação do parlamentarismo, João Goulart tornou-se presidente com poderes restritos. O presidencialismo seria restaurado em janeiro de 1963. Com isso, Jango, como era conhecido o presidente, recuperou seu poder de mando.
As reformas de base propostas por Goulart eram pautas fundamentais ao período. Entretanto, foram utilizadas pela oposição para uma grande campanha contrária aos interesses do governo, taxado de comunista, realizada em conjunto com setores da sociedade, sendo a reforma agrária, uma das mais combatidas. Ao mesmo tempo, a estratégia de conciliação de Jango, que promovia o diálogo com frentes partidárias opositoras, causou falta de apoio maciço por parte da esquerda, que observava a situação com desconfiança.

Diante da repercussão negativa, entre a oposição e a imprensa, de um discurso de Jango, na noite de 30 de março de 1964, onde ele afirmava que, no Brasil, era necessário um “golpe das reformas”, setores do Exército se organizaram, no dia seguinte, e as tropas comandadas pelo general Olympio Mourão Filho, apoiadas pelo governador Magalhães Pinto de Minas Gerais, deram um golpe de Estado, tomando o poder na madrugada de 1º de abril de 1964.

No Rio Grande do Sul, o golpe foi apoiado pelo governador Ildo Meneghetti (PSD) e pelo III Exército, sediado em Porto Alegre. Deflagrou-se, assim, a Operação Farroupilha, um plano estratégico que havia sido elaborado no ano anterior, como possibilidade de ação do governo estadual para quando o golpe fosse posto em prática. Tal opção previa que a sede do governo fosse transferida da capital para outra região. Diante da efetivação da estratégia, foi escolhida a cidade de Passo Fundo, que abrigaria os poderes por período indeterminado.

A referida operação envolvia um plano para impedir qualquer manifestação de Goulart em prol de permanecer no poder, tendo em vista a proximidade do presidente deposto com seu estado natal e o apoio recebido por seu cunhado, Leonel Brizola, ex-governador do Rio Grande do Sul. Brizola havia sido peça fundamental para a posse de Jango, em 1961, ao promover a Campanha da Legalidade. Temendo possível invasão de manifestantes ao Palácio Piratini, sede do governo estadual, Meneghetti optou pela transferência do poder para a capital do Planalto Médio.

O governador chegou a Passo Fundo na noite de 1º de abril, acompanhado por alguns secretários e autoridades civis e militares. Após conferenciar com as principais figuras do cenário passo-fundense, como o prefeito Mário Menegaz e o Comandante da Brigada, o major Victor Hugo Martins, Meneghetti rumou para o Quartel do 2º Batalhão da Brigada Militar, no Bairro Exposição (atual São Cristóvão), onde a sede do governo foi instalada na manhã seguinte. O lugar oferecia segurança e conservava poder de fogo para combater qualquer manifestação ou movimento contrário ao governo colaboracionista.

Dessa forma, em 02 de abril, tropas da Brigada Militar de outras regiões rumaram a Passo Fundo, a fim de proteger a “Capital da Liberdade”, nominação corrente nos discursos dos que defenderam o golpe. Havia o temor de que a resistência do III Exército, leal ao presidente deposto, pudesse desencadear uma guerra civil no Rio Grande do Sul.

Contudo, a possível contestação foi desencorajada por Goulart ainda no dia 02. Na intenção de evitar conflitos de grandes dimensões, após passagem por Porto Alegre e São Borja, Jango seguiu para o exílio em Montevidéu. A notícia chegou a Passo Fundo no mesmo dia. Com isso, o governador decidiu retornar a Porto Alegre, para onde partiu na manhã de 03 de abril. 

Ao chegar ao destino, a vitória golpista encerrava com êxito a “Operação Farroupilha”. Passo Fundo, nessa curta experiência como sede do governo, levou consigo a alcunha de “Capital da Liberdade”, muito embora, paradoxalmente, todos estes eventos descortinassem o início da ditadura militar brasileira.

Na foto, ao centro, o governador do Rio Grande do Sul, Ildo Meneghetti (de óculos); ao seu lado, usando capacete, o Comandante da Brigada Militar, o tenente-coronel Victor Hugo Martins, junto a uma metralhadora montada em uma das janelas do Quartel da BM, no dia 02 de abril de 1964. Fonte: Revista Manchete, n. 630, 16 maio 1964.