Grupos de Onze (1964): a Igreja Católica disse Não

Anacleto Zanella – Doutorando em História/PPGH/UPF

Fonte da imagem – Acervo digital do projeto Documentos Revelados. Disponível em <https://www.plural.jor.br/documentosrevelados>

Como afirma o historiador Alessandro Batistella, os Grupos de Onze foram um fenômeno de curta duração. Nasceram no final de 1963 e início de 1964, incentivados pelo então Deputado Federal Leonel Brizola (Partido Trabalhista Brasileiro – PTB), ex-Governador do Rio Grande do Sul. Através de pronunciamentos radiofônicos, Brizola propunha a criação de Grupos de Onze Companheiros em todo o Brasil. Entre os objetivos dessa estratégia política estava o de pressionar o Congresso Nacional para que fossem aprovadas as chamadas Reformas de Base (como a reforma agrária) – defendidas por muitos setores da sociedade e encampadas pelo então presidente João Goulart (Jango, também do PTB), mas que recebiam forte oposição dos setores conservadores. 

Lembremos que os Grupos de Onze nasceram no contexto da Guerra Fria internacional, na qual o bloco capitalista (liderado pelos Estados Unidos) e o socialista (liderado pela União Soviética) disputavam a hegemonia política e econômica no mundo. A vitória da Revolução Socialista Cubana (1959) ampliou ainda mais essa disputa em toda a América Latina. Assim, nesse período, a pregação anticomunista era muito forte e tal discurso era assumido por muitas organizações civis, militares e religiosas de cunho conservador.
Nesse cenário, portanto, a Igreja Católica também assumiu posição. Em nível de cúpula, a maioria de suas lideranças abraçou uma postura pró-capitalismo e anticomunista, como foi o caso de Dom Vicente Scherer, Arcebispo de Porto Alegre. Nas bases sociais, porém, muitas de suas lideranças defendiam as Reformas de Base no Brasil.  É nesse contexto que temos condições de compreender uma das notícias publicadas pelo jornal O Nacional, de Passo Fundo (RS), em 6 de março de 1964: “Pároco de Sertão lançou proibição: Não pode ser padrinho de crisma quem fôr nacionalista ou do “GRUPO DOS 11”. Era a manifestação pública do padre Máximo Coghetto, pároco do município de Sertão (município recém emancipado, no ano de 1963). 

Ressalte-se que a manifestação do padre Coghetto deu-se através da publicação de um edital destacando que, conforme as leis eclesiásticas, podiam ser padrinhos de Crismas “somente os católicos em comunhão com a Santa Igreja”. E, portanto, não podiam ser padrinhos: 1º - os casados só pelo civil; 2º - os ajuntados; 3º - todos os que pertenciam a seitas cristãs: evangélicos, luteranos, assembleia de Deus; 4º - comunistas, nacionalistas: especialmente os dos Grupos de 11.  E concluía: “Por isso cuidem os pais, na escolha dos padrinhos de seus filhos, para que sejam católicos bons, de virtudes comprovadas que sirvam de exemplo para os afilhados”. Chama a atenção que a referida notícia com o edital foi republicado no jornal A Voz da Serra, de Erechim, em 10 de março de 1964, ampliando ainda mais a repercussão do religioso.  

Com o Golpe Militar de 31 de março/1º de abril de 1964, os participantes dos Grupos de Onze que haviam se organizado atendendo ao chamamento de Brizola – em maioria agricultores -, foram duramente perseguidos e muitos deles enquadrados na Lei de Segurança Nacional, apesar de que os inquéritos militares instalados não comprovaram que esses Grupos representassem perigo ao país. Por críticas locais ou pela nova configuração política, os Grupos de Onze foram extintos, embora a memória sobre o vínculo a eles e mesmo sua consideração como prejudicial ao país se mantivessem entre setores conservadores e católicos ainda por muitas décadas.