Pesquisa e Inovação

Uma ferramenta para desvendar mistérios

30/04/2020

10:33

Por: Caroline Simor

Fotos: Divulgação

Professor da UPF explica como funciona a genética: a ciência da vida. Para aprofundar, na segunda-feira, dia 4 de maio, ocorre um bate papo online sobre o tema

Considerada a ciência da vida, a genética é a ferramenta que trabalha para explicar grande parte da variabilidade fenotípica existente entre os indivíduos de uma mesma espécie. Peça fundamental para desvendar os mistérios de tudo que é vivo ou morto, ela permite estudar seres que viveram a milhares de anos. A genética evolui a cada instante e permite que descobertas relacionadas com doenças, comportamentos, vírus e bactérias sejam explicados, entendidos e combatidos. 

Quem explica é o professor Dr. Ricardo Zanella, docente dos cursos de Medicina e Medicina Veterinária, e do Programa de Pós-Graduação em Bioexperimentação da Universidade de Passo Fundo.

Ele lembra que tudo começou por volta de 1865, quando Gregor Mendel descreveu pela primeira vez as leis da hereditariedade, hoje chamadas de leis de Mendel e que regem a transmissão dos caracteres hereditários. “Esta diversidade é causada pela ação dos genes, os genes são pequenos segmentos de DNA que são responsáveis pela expressão das características fenotípicas. Os genes são compostos por combinações de sequências de ácidos nucleicos (são aquelas letrinhas A - para adenina, C - citosina, T -timina, G guanina), a junção de três destes alelos formam um aminoácido, e a junção destes aminoácidos formam uma proteína, que é geralmente o que nós observamos”, esclarece, ressaltando que o tamanho completo do genoma humano é superior a 3 bilhões destas letras, perfazendo cerca de 20 a 25 mil genes, localizados em 22 pares de cromossomos autossômicos e um par de cromossomos sexuais que são responsáveis pela manutenção das características dos indivíduos.

Zanella pontua que duas importantes teorias foram responsáveis pela compreensão dos processos evolutivos desta ciência, citando, por exemplo, os trabalhos de Jean-Baptiste Lamarck e Charles Darwin. Segundo o professor, mesmo tendo hipóteses diferentes, eles defendiam o mesmo propósito: Lamarck defendia a evolução como causa da variabilidade, sendo que este processo evolutivo poderia ser explicado pela ação do ambiente. Já Darwin defendia o ponto sobre a seleção natural, onde os indivíduos mais adaptados conseguiriam sobreviver deixando maior número de descendentes, consequentemente transmitindo seus genes para a população. “Juntando todas estas informações podemos concluir que o ambiente como um todo foi o grande impulsionador pela geração da variabilidade genética/fenotípica encontrada nos indivíduos, bem como os processos evolutivos, mas como tudo tem uma reação, o ambiente também foi se alterando com o passar dos anos, principalmente devido a ação do ser humano. Com isso temos este mundo em constante evolução. Tudo é uma questão de ação e reação”, destaca.

Mas o que a genética pode desvendar?
De maneira resumida, o presente, passado e o futuro da vida. De acordo com Zanella, a genética pode ser utilizada para desvendar o que ainda não foi explicado. Em suas aulas, trabalhos e pesquisas, o docente utiliza o termo de genômica, que é usado para explicar os estudos da genética envolvendo o genoma dos indivíduos.

Então, de acordo com o professor, temos a era dos ‘OMAs’, uma forma reduzida de apresentar o genoma, proteoma, transcriptoma, epigenoma e nutrigenoma. Com isso é possível explicar algumas variações, como por exemplo, porque algumas pessoas comem pouco e engordam? Ou melhor, porque algumas pessoas comem muito e não engordam? 

Existem vários trabalhos apresentando o efeito conjunto de genes modulando a obesidade dentre outros fenótipos. Segundo Zanella, não é um trabalho isolado de cada gene, mas sim, um efeito poligênico, onde vários genes vão agir em conjunto para a modulação do fenótipo.  “Assim como no exemplo da obesidade, podemos citar várias outras características que podem ser explicadas pela genética, como problemas cardíacos, câncer. Mas a genética não é a única influenciadora, temos também a ação do ambiente, pois o fenótipo dos indivíduos é composto pela ação da genética, mais o efeito ambiental”, ressalta, lembrando que existem outras características que são controladas por um só gene, com diferentes tipos de ação gênica, como a polidactilia, acondroplasia, hemofilia ou o albinismo. “Até mesmo a habilidade de dobrar a língua é genético e é causada por um gene que, por sinal, tem uma ação dominante. Estes já o ambiente tem pouco efeito em sua expressão”, relata.

O professor esclarece que, em tese, os testes genéticos não levam em conta as diferenças ambientais nos seus cálculos, por isso eles geram resultados de uma probabilidade. A nova fronteira do conhecimento científico que pretende acessar essa questão é conhecida como epigenômica. “Tratam-se de alterações químicas não estruturais no DNA, que estão associadas à exposição das células a diferenças ambientais. Por exemplo, já se reconhece a existência de alterações epigenéticas associadas às exposições maternas a disruptores endócrinos, e a ação destes agentes na prole destes indivíduos. O que seriam estes disruptores endócrinos? Podemos citar álcool, a poluição ou agrotóxicos. Mas o mais interessante e preocupante é que estas alterações não estruturais no genoma poderão ser transmitidas para as novas gerações. Esta é uma área muito nova. Imagino que esse conhecimento seja incorporado na prática não antes de dez anos”, frisa, pontuando que a tecnologia e os estudos com a genética evoluíram muito, mas ainda estão distantes da total compreensão e de seu uso pleno.

A genética e o novo coronavírus
O mundo todo está buscando na ciência a solução para combater a Covid-19. Embora ainda não exista uma vacina e pairem muitas dúvidas sobre o próprio vírus, foi por meio da genética que cientistas sequenciaram e desvendaram o agente causador e identificaram sua origem. 

Zanella explica que com o sequenciamento do genoma da Covid-19, foi possível verificar a alta similaridade dele com outros vírus, como SARS-CoV-2 e com Coronavírus de Morcegos. “A Covid-19 é um vírus de RNA de fita única com um tamanho minúsculo de 28,818 pares de base. Algo muito interessante sobre este vírus é o seu potencial mutagênico, que é bem menor do que as mutações que ocorrem nos vírus comuns da gripe. Este processo de mutação faz parte do ciclo de vida dos vírus. Da mesma forma que nós humanos evoluímos, os vírus também evoluem, a única diferença é que eles são muito mais rápidos”, destaca. 

Para o professor, as mutações não são sempre ruins, já que às vezes elas podem permitir a diminuição da patogenicidade do vírus, diminuindo o seu potencial de transmissão e de letalidade. “Este baixo potencial de mutação, verificado na Covid-19, pode ser um ponto a nosso favor, principalmente no desenvolvimento de vacina. Neste caso quando a vacina for disponibilizada para a população, possivelmente vai proteger contra a grande maioria da Covid-19 que circula no mundo”, sinaliza.

Evento debaterá evolução genética
Pensando em conversar sobre o tema e permitir que a comunidade tenha acesso ao conhecimento científico e ao que vem sendo estudado na área, a UPF promoverá um encontro online com o tema “Vamos falar sobre evolução genética?”. A atividade ocorrerá na segunda-feira, dia 4 de maio, às 14h, com acesso pelo link. Além do professor Ricardo, participam os pesquisadores Dr. Fábio Pértille e Dr. Carlos G. Bosagna, ambos da Linköpings Universilet, da Suécia.

De acordo com Ricardo, o evento surgiu como parte integrante da matéria de Genética e Melhoramento animal, ministrada por ele no curso de Medicina Veterinária. A proposta é promover um encontro em formato de bate-papo sobre evolução, trazendo diferentes perspectivas de diversos pesquisadores que trabalham no campo da genética e com variados backgrounds científicos. O grande objetivo deste nosso projeto é de trazer conhecimento para a comunidade, afinal está é uma das nossas funções como Educadores.