Criadouro científico foi responsável pela preservação e cuidado de duas espécies de papagaios ameaçadas de extinção ao longo de 27 anos
Instalado ao lado do zoológico da Universidade de Passo Fundo (UPF) em 1993, o Centro de Reprodução de Psitacídeos – William Belton (CREP) encerrou suas atividades de pesquisa no mês de fevereiro. Ao longo de 27 anos, o criadouro científico atuou na reprodução de duas espécies ameaçadas de papagaios do Brasil: o papagaio-charão e papagaio-de-peito-roxo, numa atividade de conservação fora do ambiente natural das espécies (conservação ex situ).
O criadouro era uma das atividades do Projeto Charão, vinculado ao Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e à Associação Amigos do Meio Ambiente (AMA), que segue com os trabalhos de pesquisa e aplicação de estratégias de conservação em vida livre, no ambiente natural, com as duas espécies de psitacídeos. Até o encerramento das atividades, o CREP tinha como responsável técnico o professor e biólogo Dr. Jaime Martinez, com assessoria da bióloga Nêmora Pauletti Prestes, do Departamento de Vida Silvestre da Associação Amigos do Meio Ambiente (AMA).
Com as ações realizadas no Centro, foi possível ampliar o conhecimento sobre as espécies, melhorar o manejo em condições de cativeiro para um maior sucesso reprodutivo e apoiar o ensino de graduação e pós-graduação nas áreas de manejo de vida silvestre e de comportamento animal. Martinez ressalta que, ao longo de suas atividades, o CREP contou com o monitoramento e fiscalização dos órgãos públicos ligados ao setor de fauna silvestre, inicialmente pelo Ibama e posteriormente pelo Setor de Fauna da Secretaria Estadual do meio Ambiente (DBIO/Sema).
O coordenador comenta que, em 27 anos de atividades, foi possível gerar dezenas de filhotes dos papagaios, principalmente do papagaio-charão, ajudando a estabelecer uma população de segurança para esta espécie. De acordo com ele, para ampliar a efetividade dessa população de segurança, indivíduos nascidos no CREP foram transferidos paras outros criadouros e zoológicos do Brasil, a exemplo do Zoológico Municipal de Curitiba, Parque das Aves de Foz do Iguaçu, Criadouro Onça Pintada e o Mantenedouro Primaves de Passo Fundo.
O criadouro científico da UPF também foi espaço de formação para muitos acadêmicos dos cursos de Ciências Biológicas e Medicina Veterinária. Cerca de 35 estudantes e profissionais que foram bolsistas ou voluntários, puderam praticar estratégias que buscavam oferecer um melhor bem-estar aos animais, como consequência melhorar o êxito na reprodução dos papagaios. “O criadouro científico auxiliou nos estudos e geração de conhecimentos em dissertação de mestrado, trabalhos de conclusão de curso e iniciação científica nas áreas de comportamento, reprodução, alimentação e sanidade dos papagaios”, explica Martinez.
Ele ainda ressalta que muitas metodologias e técnicas que foram aplicadas nos papagaios em vida livre, antes foram testadas em condições de cativeiro no CREP, a exemplo dos tipos de marcação das aves, dos equipamentos de radiotelemetria e dos modelos de caixas-ninho para a reprodução das aves. “Agora a equipe de bolsistas e estagiários do criadouro passará a auxiliar nas atividades do Projeto Charão no ambiente natural nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina”, pontua.
Os animais que integravam o plantel do CREP foram transferidos no mês de fevereiro para o Parque das Aves em Foz do Iguaçu, no Paraná. A instituição, além de manter um dos zoológicos de aves mais visitados do mundo, também vem ampliando seus compromissos na conservação das aves ameaçadas da mata atlântica.
Segundo o professor Jaime, o Projeto Charão conta com a parceria do Parque das Aves no apoio à conservação do papagaio-de-peito-roxo e papagaio-charão na natureza, e na gestão da Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Papagaios-de-Altitude em Urupema/SC. Ele ressalta que, recentemente, junto com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), o Parque das Aves assumiu de ser a sede do Centro de Sobrevivência de Espécies Brasil (CSE) que buscará impulsionar esforços de conservação para as espécies ameaçadas no país.
Apesar da transferência dos papagaios de Passo Fundo para Foz do Iguaçu, a direção do Parque das Aves continuará na condução das ações que o Projeto Charão vinha conduzindo no criadouro científico. “O trabalho se dará, principalmente, na área de reprodução das aves e na experimentação e validação de alguma técnica antes de ser aplicada nas aves no ambiente natural. Sua diretora, Carmel Croukamp, afirmou que as atividades do CREP continuariam, agora em outro endereço”, comenta Martinez.
Profissionais que farão a diferença para a preservação
A experiência com o criadouro científico da UPF fez com que a Dra. Nêmora Pauletti Prestes fosse convidada para atuar como Studbook Keeper do papagaio-charão.
O Studbook keeper é o profissional que estuda e organiza a população de espécies ameaçadas no Brasil e no mundo em condições de cativeiro, buscando assegurar que a população de segurança tenha um tamanho adequado, boa diversidade genética e estabilidade demográfica. É de responsabilidade desses profissionais manter um banco de dados sobre a espécie ameaçada no Brasil e no mundo, a história desses indivíduos, orientando os programas de reprodução em cativeiro, tornando efetiva essa ferramenta de manejo científico das populações.