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“Sempre pensamos que ser pai e mãe não estava vinculado com o ato de ‘gerar na barriga’ mas sim no coração. E seria tão especial quanto”

22/05/2020

15:44

Por: Assessoria de Imprensa

Fotos: Divulgação

Segunda-feira (25) é Dia Nacional da Adoção. O Brasil tem mais de 33,8 mil crianças a espera de um lar

Os dados disponíveis no novo painel on-line do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), implantado nacionalmente em 2019, apresentam mais de 33,8 mil crianças abrigadas em instituições e casas de acolhimento no Brasil. No ano passado, o Rio Grande do Sul (RS) ocupou o terceiro lugar na lista de estados com mais adoções realizadas. Isabel Santos de Quadros (52) e João Tavores de Quadros (58), há 11 anos, realizavam o processo adotivo em Carazinho/ RS.

Os problemas para engravidar e o desejo de ter um filho, fizeram o casal se manter positivos na lista de espera, apesar da demora no processo. A gestação que para Isabel e João, durou dois anos e meio, trouxe Gabriel - na época ainda bebê, para a família. “Passamos por toda a burocracia necessária, entrega e coleta de papéis, entrevistas e avaliações com a Assistência Social. Por último, o Juiz da Vara da Infância de Carazinho, nos tornou aptos para a fila da adoção”, relata Isabel.

A parte mais angustiante no processo adotivo para a família, foi a demora. “Depois da aprovação do Juiz, vem a espera, na época a fila ainda não era nacional. Passávamos no Fórum algumas vezes. Um dia lembro que entrei para conferir a lista e estávamos em 28º, um ano depois em 23º, cheguei a acreditar que íamos envelhecer na fila, mas a vontade de sermos pais nos mantinha esperançosos”, conta Isabel, que sempre acreditou na força do amor: “sempre pensamos que ser pai e mãe não estava vinculado com o ato de ‘gerar na barriga’ mas sim no coração. E seria tão especial quanto”, completa.

Quase dois anos e meio depois de entrarem na fila de espera, o sonho de segurar o filho no colo se realizou. Isabel relata o processo adotivo com muito carinho, ela e João, descobriram juntos a melhor forma de se adaptar a uma gestação à distância. “Ser mãe é maravilhoso (...), lembro de quando eu vi o Gabriel pela primeira vez acho que foi a experiência mais maravilhosa do mundo, a gente não sabe o que sentir (...). O Gabriel sempre foi muito amado pelos nossos amigos e com eles, os dias iam passando e íamos nos descobrindo como pais, o Gabriel nos completou. É nosso menino, nosso amigo, parceiro, um companheiro”, relata Isabel.

Apesar da experiência bem-sucedida com Gabriel, o casal que continuou na fila após a adoção, teve outras experiências que não deram certo. João, relata que juntos, decidiram sair da fila. “Há quase dois anos atrás, tivemos experiências com crianças mais velhas, com a idade do Gabriel. Infelizmente não deu certo, não sabemos dizer o porquê. Talvez falha nossa, talvez não houve adaptação” comenta.

Para ele, o processo adotivo funciona relativamente bem e com muita melhora. “O sistema brasileiro melhorou bastante, os juizados estão tentando agilizar o processo para que as crianças possam ser colocadas para a adoção mais cedo. Nós estivemos uma experiência bem-sucedida e outras não. Quando a criança é mais velha a adaptação ocorre de outra maneira, quanto mais cedo o juizado determinar que ela não pode ficar com os pais biológicos, mais cedo ela encontra um outro lar, e a adaptação é feita de maneira mais positiva”, pontua João.

Hoje, Gabriel tem 11 anos e faz parte do grupo de crianças adotadas que conquistaram uma família. “Esses dias, estávamos eu e ele conversando, parei para analisar e notei que muitas vezes me vejo nele. Somos muito parecidos. O Gabriel, entretanto, me disse: ‘mãe, eu não sou tão parecido assim com você. Você é mais branca que eu, teu cabelo não é tão ‘pichaco’ como o meu’. Falei para ele que isso não importava, o que importa mesmo é o que temos de igual no coração, onde ele foi gerado (...). A adoção é um ato de amor, sem qualquer dúvida. Esse ato não tem cor, não tem raça, não tem sexo. É amor. E só”, completa Isabel.

A adoção e os aspectos legais

Muito mais que uma vontade ou necessidade, a adoção envolve diversos aspectos legais. Conforme o juiz titular da Vara de Família e Sucessões de Passo Fundo, que também está substituindo na Vara Regional da Infância e Juventude, da qual foi titular por cerca de 11 anos, Me. Dalmir Franklin de Oliveira Junior, o processo de adoção, que é uma das formas de colocação em família substituta, as outras são a guarda e a tutela, estabelece uma nova relação de parentalidade para a criança e o adolescente, aonde elas passam a ter novos pais. “Assim, é possível nos casos de órfãos ou quando os pais foram destituídos (perderam) o poder familiar dos seus filhos (podem consentir, abrir mão do poder familiar ou serem processados por fatos graves que indicam a falta de condições para serem pais). Assim, com a decisão judicial de extinção do poder familiar a criança e o adolescente estão aptos a ser adotados e, para isso, serão incluídos em um cadastro nacional”, explicou.

De acordo com o juiz, que também é professor da Faculdade de Direito da Universidade de Passo Fundo (UPF), quem quer adotar, por sua vez, deverá ajuizar um procedimento junto à Vara da Infância de sua cidade para se habilitar à adoção, juntando vários documentos que estão previstos no ECA. Passarão por avaliações psicológica e social, a fim de verificar se tem condições potenciais de serem pais adotivos. Proferida decisão positiva, são incluídos também no cadastro nacional.

Ordem cronológica

O cadastro é único e segue uma ordem cronológica. “Quando está definida a situação da criança/adolescente, o juiz determina que a equipe técnica do JIJ faça buscas no cadastro de pessoas que queiram adotar uma criança com aquele perfil. Elas são contatadas para ajuizar a ação de adoção, deferindo-se, se for o caso, a guarda provisória e fixando o período de convivência (que servirá para verificar se se constitui o vínculo afetivo, social, psicológico) para o estabelecimento desta nova relação de parentalidade”, explicou o juiz.

Professores da UPF ministram curso para candidatos a pais adotivos

O curso de adoção está previsto na Lei 12010/09, com o objetivo de esclarecimento dos postulantes a adoção sobre dúvidas jurídicas, pedagógicas, psicológicas e de assistência social. “Desde a implementação aqui na Comarca de Passo Fundo a UPF é parceira, por meio de Convênio de Cooperação firmado entre a Vice-Reitoria de Extensão (VREAC) e o Juizado da Infância e Juventude - JIJ, sendo que a UPF disponibiliza professores das quatro áreas do conhecimento, sendo dos cursos de Direito, Pedagogia, Psicologia e Serviço Social”, ressaltou a advogada e professora Me. Renata Holzbach Tagliari.

Segundo a professora o curso é ministrado três vezes ao ano, a partir da demanda dos processos de habilitação para adoção. A organização é realizada pela equipe técnica do Fórum, sendo que o curso conta ainda com o apoio da SEMCAS e do grupo Adotchê (pais e simpatizantes da adoção). “Todas as pessoas interessadas em adotar precisam realizar o curso, como uma das etapas obrigatórias do processo, sendo que procura-se trabalhar muito com questões e dúvidas práticas a respeito da adoção. Nas questões jurídicas, os interessados buscam esclarecer dúvidas quanto as fases do processo, a demora da finalização da adoção, a diferença entre a guarda e a adoção, a possibilidade de conhecimento dos genitores (pais biológicos) pelo filho após a adoção, direitos com relação a licença maternidade e paternidade, inclusão em plano de saúde, novo registro da criança”, frisou.

Quem pode adotar

Estão hoje habilitados para adoção todas as pessoas maiores de 18 anos, com capacidade intelectual e financeira para se tornar pai/mãe. Além disso, Entre o adotante e o adotado, a lei exige uma diferença de idade de, no mínimo, 16 anos.

Ainda, deve-se preencher requisitos legais como idoneidade moral e social e boa condição de saúde mental e física.

Deve-se possuir estabilidade pessoal (psíquica, profissional, familiar).

Pessoas casadas, em União Estável, casais heterossexuais ou homossexuais e pessoas solteiras podem adotar.

Familiares consanguíneos também podem adotar seus parentes, exceto adoção de avós dos netos ou entre irmãos. Tios podem adotar sobrinhos.

Inclusive, a Lei 12010/09 (Lei de Adoção), beneficia a permanência da criança na família biológica, tratando a adoção como medida de exceção (quando não há possibilidade de permanência com pais ou familiares consanguíneos).

Tempo de espera

Conforme a professora Renata, todos os interessados na adoção, quando realizam o pedido de habilitação, passam por uma entrevista psicossocial, realizada pela equipe técnica do Juizado da Infância e Juventude, onde é possível requerer algumas preferências ou características com relação ao adotado, como o sexo, idade mínima e máxima, etnia, exclusão ou aceite de doenças crônicas em grau leve ou grave, grupo de irmãos, entre outros. “A partir desta entrevista se monta o perfil do adotado, sendo o adotante incluído no Cadastro de Adoção a partir destas preferências. Infelizmente, a demora em adotar muitas vezes acontece justamente porque a maioria das pessoas adotantes procuram o mesmo perfil de adotados, ou seja, bebês de até dois anos, brancos, saudáveis, sem irmãos mais velhos. Para estes casos, geralmente o tempo de espera é de 4 a 7 anos, pois a maioria das crianças e adolescentes aptas para adoção não se enquadram nesse perfil”, apontou Renata.

Atualmente, vem se estudando a possibilidade de interessados conhecerem crianças e adolescentes aptos a adoção através de visitas as casas de acolhimento ou disponibilidade de vídeos sobre estes, porém, ainda se verifica se esta medida vem ao encontro dos interesses dos infantes, pois pode gerar expectativas frustradas, tornando ainda mais danoso a condição de abandono a qual já foram expostos na família biológica.