Jornada

Pedro Gabriel traz o universo de Eu me chamo Antônio para a Jornada de Literatura

19/09/2017

16:05

Por: Camila Guedes

Fotos: Leo Aversa

Ao lado de Zeca Camargo, Rafael Coutinho e Roger Mello, o escritor é um dos convidados da mesa de debates “Literatura e imagem: além dos limites do real”, no dia 3 de outubro

“Poeta é feito de si e silêncio”. Foi de uma necessidade de romper com esse silêncio que Pedro Gabriel criou Antônio. O personagem é o protagonista do universo das obras Eu me chamo Antônio e Segundo Eu me Chamo Antônio e quem transformou o escritor em um dos nomes conhecidos da poesia contemporânea. E é em função desse universo, que mistura prosa com ilustração, que o escritor, ao lado de Zeca Camargo, Rafael Coutinho e Roger Mello, é um dos convidados da mesa de debates “Literatura e imagem: além dos limites do real” que acontece no dia 3 de outubro, dentro da programação da 16ª Jornada Nacional de Literatura.

O que pouca gente sabe é que os traços e as palavras desenhados em guardanapos são muito mais do que rabiscos inventados pelo escritor no balcão do Café Lamas e que conquistaram as redes sociais. “O que escrevo e desenho dentro do mundo do Eu me chamo Antônio são fragmentos de uma história maior, de um romance que ainda será escrito. A primeira frase que coloquei no Facebook (e que continua até hoje no meu perfil) é “Antônio é o personagem de um romance que está sendo vivido, escrito”. Essa descrição resume bem o universo do meu trabalho”, explica o escritor. 

Esse universo começou a ser criado ainda na antiga colônia francesa de Chade, país no meio da África, onde o escritor passou sua infância. Foi lá que, mesmo sem ainda saber ler direito, se encantava com a sequência de imagens coloridas nas coleções de Tintim e Asterix e Obelix. “Entrei no mundo das palavras por causa dos desenhos”, justifica, aos risos. O primeiro contato literário, no entanto, foi com uma velha conhecida da literatura brasileira: a Turma da Mônica, presente do avô sempre que voltava do trabalho. “Essas tirinhas bem-humoradas, sem dúvida, me marcaram muito”, lembra. A partir daí, aos poucos, foi descobrindo o sentido das palavras. Desde então, carrega um caderno para anotar toda e qualquer ideia que venha à cabeça, uma forma de não deixar as ideias escaparem. 

Se foi sorte ou um acaso, não se sabe, mas foi no dia que em que esqueceu seu caderno em casa que nasceu seu primeiro guardanapo. “Eu tinha esse hábito de sempre andar com um caderninho de bolso pra lá e pra cá, mas naquele dia eu esqueci o tal caderno em casa e as ideias estavam pulsando na minha cabeça. Eu precisava anotá-las em algum lugar. O jeito foi parar no balcão do Café Lamas – um bar que ficava no meio do caminho entre o ponto do ônibus e o meu apartamento –, pegar uma pilha de guardanapos em branco e começar a rabiscar coisas de forma espontânea, sem nenhuma pretensão”, conta. Segundo o escritor, foi nesse momento, no final de 2012, que ele sentiu a sensação de que era aquilo que lhe fazia bem e o motivava a querer dizer algo. E foi na internet que deu seus primeiros passos. 

Universo de referências
Hoje, quatro anos, três livros e dois mil guardanapos depois, o escritor lembra que seu principal desafio talvez tenha sido provar que o Eu me chamo Antônio não era apenas uma ideia para a internet ou uma página bonitinha para ganhar likes e compartilhamentos. “Eu não criei o Eu me chamo Antônio para a internet. O livro não nasceu no Facebook. Nasceu de uma necessidade de quebrar minha timidez, romper meu silêncio. Antônio, o personagem, nasce no meio disso tudo, de forma espontânea, logo, sincera. O conceito vai muito além. O livro comprovou que meus leitores também me acompanharam nas prateleiras. Isso mostra que o mais importante sempre será o conteúdo, não a plataforma”, destaca. 

Conteúdo que tem como característica o casamento da palavra e da imagem. Tanto que não se limita a uma única forma de expressão. No universo que criou, mistura várias referências diferentes: gráficas, sonoras, analógicas, digitais, todas muito influenciadas por sua própria infância. “Eu me lembro de ficar horas e horas rabiscando folhas em branco no escritório do meu pai, enquanto ele trabalhava. O registro mais forte que tenho na lembrança é o desenho de uma girafa que tenho guardado até hoje. As girafas sempre me encantaram. Se os poetas fossem bichos, sem dúvida alguma, seriam girafas: esses seres que vivem com as patas no chão e a cabeça nas nuvens. Ou seja, esses seres que viajam, voam, mas mantêm sempre raízes. A infância é a minha raiz mais firme”, conta. 

“O artista tem que ir aonde o povo está”
Ao contrário de muitos, Pedro Gabriel vê a internet como uma grande aliada na formação de novos leitores. Para ele, trata-se de um processo natural do nosso tempo. “O artista tem que ir aonde o povo está, já dizia a canção Bailes da Vida, do Milton Nascimento. O povo hoje está também na internet, nas redes sociais. É natural que surjam cada vez mais escritores, poetas ou artistas por essa plataforma”, ressalta. O que não quer dizer, ainda na opinião do autor, que exista literatura de internet. Para ele, internet não é gênero literário, apenas um caminho ou uma vitrine para chegar com menos obstáculos aos seus leitores. “Se não fosse a internet, provavelmente não teria publicado meu livro tão cedo. Mas, por outro lado, se eu não tivesse feito tanta coisa fora da internet, eu não teria conteúdo para postar e ser visto”, declara.

Ilustre poesia
Seu terceiro livro, Ilustre Poesia, lançado em 2016, marca uma ruptura. De acordo com Pedro Gabriel, é uma narrativa que se distancia dos dois primeiros livros, mas que mantém um forte elo criativo com o universo do personagem Antônio. “O meu primeiro livro foi marcado pelo medo danado de não dar certo. Há a presença muito mais marcante de trocadilhos ou frases espontâneas. No Segundo, fica mais visível o meu desejo – mesmo que tímido – de libertar as palavras para além das fronteiras dos guardanapos. Ilustre Poesia, de certa forma, encerra uma espécie de trilogia de um pré-romance. A prosa está mais presente e as ilustrações dialogam constantemente com as palavras desenhadas em cada página. Com essa nova publicação, dou mais um passo em direção à promessa do romance”, comenta. 

São 224 páginas, divididas em três partes que nasceram da pergunta “Para onde vão os nossos silêncios quando deixamos de dizer o que sentimos?”. Por mais que a presença da “escrita convencional” esteja mais evidente, Ilustre Poesia ainda preserva suas origens: o desenho em guardanapos, a brincadeira com a sonoridade ou a grafia de palavras similares, a poesia descontraída. “Essa caligrafia confusa, esse traço impreciso, essa comunicação que – ora se manifesta em versos curtos, outrora em frases mais longas – são a minha personalidade criativa. É impossível eu fugir completamente do que sou”, completa. 

E é por gostar de mostrar quem é que o escritor acredita que sua primeira vez na Jornada Nacional de Literatura, será, no mínimo, uma experiência linda afinal, para ele, marcar presença real é fundamental – ainda mais para autores que começaram a ganhar visibilidade no ambiente virtual. “Eu faço questão de sempre comparecer a esses eventos literários. Só assim o livro, o autor, o leitor – ou seja: os personagens que dão vida e sentido ao que chamamos de Literatura – sobreviverão”, finaliza Pedro Gabriel. 

Sobre o escritor
Pedro Antônio Gabriel Anhorn nasceu no coração do mundo. Mais precisamente em N´Djamena, no ano de 1984. Passou a parte mais bonita de sua infância na África, alternando entre a capital do Chade e o arquipélago de Cabo Verde. É filho de mãe brasileira e pai suíço, mas foi alfabetizado em francês.

Sem saber falar português corretamente, chegou ao Brasil em 1996 com uma mala cheia de brinquedos e lembranças. A partir da dificuldade na adaptação ao idioma, começou a prestar mais atenção na grafia e na sonoridade das palavras, a brincar com elas, a tentar entendê-las. Transformou esse distanciamento de 12 anos em poesia. Cada vez que desenha ou escreve, tem a sensação de pagar uma dívida com a sua língua materna. Sua arte o aproxima do que ele é.

Em outubro de 2012, inaugurou a página “Eu me chamo Antônio” nas redes sociais para compartilhar o que rabiscava com caneta hidrográfica em guardanapos nas noites em que batia ponto no Café Lamas, um dos bares mais tradicionais do Rio de Janeiro. É publicitário, formado pela ESPM-RJ, e autor dos livros Eu me chamo Antônio (2013); Segundo – Eu me chamo Antônio (2014); e Ilustre Poesia (2016). Todos publicados pela Editora Intrínseca.
Obras indicadas: Eu me chamo Antônio; Segundo – Eu me chamo Antônio; Ilustre Poesia

Jornada Nacional de Literatura
A 16ª Jornada Nacional de Literatura e a 8ª Jornadinha Nacional de Literatura são promovidas pela Universidade de Passo Fundo (UPF) e pela Prefeitura de Passo Fundo. Os eventos contam com os patrocínios do Banrisul, da Corsan, da Ambev, da Companhia Zaffari & Bourbon, da Ipiranga, da Panvel, da SulGás, da Triway e da TechDEC; com o apoio cultural da BSBIOS e do Sesi, patrocínio promocional da Capes, da Fapergs, da Italac e da Oniz, com a parceria cultural do Sesc, financiamento do Governo do Estado – Secretaria da Cultura – Pró-cultura RS LIC e realização do Ministério da Cultura.

As inscrições para a Jornada e para a Jornadinha estão abertas e são limitadas. Para a Jornada, o público pode se inscrever tanto para o evento completo quanto para apenas uma das noites. Os interessados devem se inscrever no portal www.upf.br/16jornada. A programação completa também está disponível no site da Jornada. Informações podem ser obtidas pelo e-mail jornada@upf.br ou pelo telefone (54) 3316-8368.